quarta-feira, 3 de junho de 2009

Crônica: Abaixo o “Abracadabra”: em Defesa do Pensamento Crítico


Dizem por aí – e até já se discutiu o assunto em termos científicos – que a única lei que brasileiro respeita mesmo é a lei do menor esforço. Generalizações assim são sempre muito arriscadas – sejam elas pronunciadas no botequim ou no meio acadêmico – e, quase sempre, são responsáveis por encaminhar qualquer debate a um final infeliz. No entanto, se essa perigosa anedota sobre o nosso tão criticado “jeitinho brasileiro” não é de toda verdadeira, serve ao menos para entabular uma discussão a respeito de práticas recorrentes entre nossos jovens (e também adultos) em sala de aula.
Há algumas semanas, um professor (de física) amigo meu protestava contra os usos e abusos, por parte de seus alunos, da “regra de três”, dizendo que estes a estavam aplicando para resolver os mais improváveis problemas. Por exemplo: diante de questões simples sobre velocidade ou aceleração, que se poderiam solucionar com equações prontas para serem usadas, bastando para isso identificar suas variáveis e fazer substituições, os alunos insistiam em usar regra de três. “É regra de três pra tudo agora!”, exclamava meu amigo professor (de física), “daqui a pouco vão usar regra de três pra somar 2 com 2”.
Segundo o angustiado mestre, não há nada de errado com a tal regra: a “dita cuja” serve para solucionar muitos problemas – uma espécie de penicilina algébrica, quase um bombril do mundo da matemática. O problema reside é em seu uso indiscriminado, que redunda provavelmente tanto da resistência ao esforço de pôr em prática o que se acabou de ensinar, quanto do anseio aparente de livrar-se o quanto antes da tarefa.
Mais amparado pelo que tenho visto e ouvido por aí, que por teorias científicas – arrisco um palpite: essa tal resistência parece ter suas raízes fincadas em certa antipatia a qualquer dúvida lançada sobre nossas confortáveis verdades. Uma espécie de mal-estar resultante da constatação de que há limites em nosso conhecimento, de que, enfim, não podemos saber tudo (e temos raiva de quem sabe) – coisa que no fundo afeta, em diferentes proporções, a todo ser humano. Aliado a isso, o anseio por soluções rápidas nos faz evitar o trabalho de pensar em profundidade.
Que fazer então (no nosso caso)? Gosto de pensar que – por fazermos parte de uma instituição federal de ensino, referência em todo estado e também no país, com 100 anos de tradição – nosso destino tem de ser grandioso. E, nesse sentido, devemos nos empenhar e aceitar desafios, enfrentar obstáculos, avançar para além de nossos limites. Nessa batalha travada no campo do saber, apenas os bravos têm vez – bravos por, entre outros feitos, suportar a própria insipiência e marchar rumo à superação. Caso tal pensamento não agrade por seu teor épico – e um tanto megalomaníaco – lancemos mão de sóbrias (e também sombrias) estatísticas: em pesquisa recente, fomos considerados o segundo pior país do mundo em conhecimento de matemática – figurando até mesmo atrás de países como a Etiópia. Dramático, não? Pois é. Bem-vindo à nossa realidade. É contra esses indicadores que lutamos.
O que queremos aqui não é ridicularizar ninguém nem abominar o uso de recursos que facilitem a resolução de problemas em sala de aula, mas exortá-los de que o pensamento curioso, investigativo, disciplinado, criativo, enfim, o pensamento crítico deve ser encarado (e praticado) como o mais poderoso recurso a ser usado a favor do conhecimento.
E, de agora em diante, na hora da prova (de física), pensem bem se usar ou não a regra de três é mesmo a melhor opção – “Hey, kids! Leave the teacher alone!”.

Bruno José – 31/05/09